HENRIQUE
MEDEIROS
LEGENDAS
Sem título, [A não essência das coisas],
2025
SOBRE
AS IMAGENS
A Não Essência das Coisas é um projeto que nasce da recusa da fotografia
enquanto ferramenta de mimese e registro objetivo do mundo visível. Partindo da
ideia de que a imagem fotográfica jamais poderia capturar a suposta essência de
um objeto ou instante, este
fotolivro propõe uma antítese à tradição essencialista da fotografia
moderna. Ele não
busca reproduzir superfícies, fixar sentidos ou documentar certezas; mas
tensionar a relação entre matéria e imagem, registro e afeto, técnica e rito.
A referência à Cámara para obtener vistas al daguerrotipo de Susse Frères (1839) não busca uma reconstituição histórica, mas propõe um diálogo simbólico com o nascimento da imagem fotográfica. A adoção do formato 1×1 surge como gesto crítico: o quadrado funciona como uma espécie de janela contida, onde a luz é obrigada a atravessar um limite preciso, quase um furo geométrico. Nesse enquadramento restrito, a imagem revela sua própria condição de aprisionamento e instabilidade. O uso de fotografias de celular, marcadas pela simplicidade técnica, reforça essa tensão, ao negar o fetiche do aparato, transforma a precariedade em elemento poético e devolve à luz seu caráter frágil e efêmero. A intenção é captar o instante mais espontâneo possível, preservando o acaso e a imperfeição como parte essencial do olhar.
O projeto confronta a lógica da fotografia como catálogo de superfícies visíveis e de essências imobilizadas. Em seu lugar, propõe-se uma fotografia subjetiva, quase mística, onde o que importa não é a nitidez da superfície, mas a densidade simbólica do que escapa à imagem. Cada fotografia é tratada como um quase-objeto; conceito de Bruno Latour que designa aquilo que transita entre o material e o imaterial, entre o objeto físico e o signo relacional. As imagens aqui não são coisas estáticas, mas entidades em trânsito, evocando o invisível, o afeto, o íntimo.
Há, portanto, uma aproximação com a noção de imagem-ritual, onde fotografar é menos um ato técnico e mais um rito de passagem entre mundos internos e externos. Essa fotografia é imperfeita porque se recusa a obedecer à ilusão de controle técnico e conceitual, reconhecendo-se como fragmento, espectro e vestígio. Ela carrega a tensão do que Barthes chamou de fantasma da imagem algo que não está mais ali, mas que insiste em permanecer.
A sequência imagética do fotolivro se constrói por meio de imagens pareadas par-a-par, criando microdiálogos e tensões entre os registros. Esse encadeamento não obedece a uma lógica racional ou narrativa linear, mas respeita a ordem do subconsciente do fotógrafo, seus impulsos, repetições e obsessões. Assim, as imagens transitam entre sonho e realidade, construindo um espaço liminar onde ambos se confundem.
A Não Essência das Coisas é, portanto, uma travessia imagética. Um fotolivro que não pretende descrever o mundo, mas sugeri-lo. Cada fotografia é uma passagem entre matéria e ideia, físico e espiritual. Mais do que capturar instantes, este projeto busca evocar a pulsação secreta das coisas, aquilo que a superfície visível não pode conter, mas que a imagem, em sua precariedade e subjetividade máxima, é capaz de pressentir.
A referência à Cámara para obtener vistas al daguerrotipo de Susse Frères (1839) não busca uma reconstituição histórica, mas propõe um diálogo simbólico com o nascimento da imagem fotográfica. A adoção do formato 1×1 surge como gesto crítico: o quadrado funciona como uma espécie de janela contida, onde a luz é obrigada a atravessar um limite preciso, quase um furo geométrico. Nesse enquadramento restrito, a imagem revela sua própria condição de aprisionamento e instabilidade. O uso de fotografias de celular, marcadas pela simplicidade técnica, reforça essa tensão, ao negar o fetiche do aparato, transforma a precariedade em elemento poético e devolve à luz seu caráter frágil e efêmero. A intenção é captar o instante mais espontâneo possível, preservando o acaso e a imperfeição como parte essencial do olhar.
O projeto confronta a lógica da fotografia como catálogo de superfícies visíveis e de essências imobilizadas. Em seu lugar, propõe-se uma fotografia subjetiva, quase mística, onde o que importa não é a nitidez da superfície, mas a densidade simbólica do que escapa à imagem. Cada fotografia é tratada como um quase-objeto; conceito de Bruno Latour que designa aquilo que transita entre o material e o imaterial, entre o objeto físico e o signo relacional. As imagens aqui não são coisas estáticas, mas entidades em trânsito, evocando o invisível, o afeto, o íntimo.
Há, portanto, uma aproximação com a noção de imagem-ritual, onde fotografar é menos um ato técnico e mais um rito de passagem entre mundos internos e externos. Essa fotografia é imperfeita porque se recusa a obedecer à ilusão de controle técnico e conceitual, reconhecendo-se como fragmento, espectro e vestígio. Ela carrega a tensão do que Barthes chamou de fantasma da imagem algo que não está mais ali, mas que insiste em permanecer.
A sequência imagética do fotolivro se constrói por meio de imagens pareadas par-a-par, criando microdiálogos e tensões entre os registros. Esse encadeamento não obedece a uma lógica racional ou narrativa linear, mas respeita a ordem do subconsciente do fotógrafo, seus impulsos, repetições e obsessões. Assim, as imagens transitam entre sonho e realidade, construindo um espaço liminar onde ambos se confundem.
A Não Essência das Coisas é, portanto, uma travessia imagética. Um fotolivro que não pretende descrever o mundo, mas sugeri-lo. Cada fotografia é uma passagem entre matéria e ideia, físico e espiritual. Mais do que capturar instantes, este projeto busca evocar a pulsação secreta das coisas, aquilo que a superfície visível não pode conter, mas que a imagem, em sua precariedade e subjetividade máxima, é capaz de pressentir.
Texto de Henrique Medeiros, 2025
MINI BIO

HENRIQUE MEDEIROS
Natural de Vila Velha, Espírito Santo, iniciou sua trajetória na fotografia como um flâneur, registrando com o celular cada impressão e curiosidade sobre luz e sombra. De forma autodidata, aprendeu a fotografar no modo manual durante uma viagem a Goiás para reencontrar seu tio, a quem não via há anos. Essa experiência, aliada às reconexões familiares e à beleza estética do lugar, transformou sua visão de mundo, despertando nele o interesse por capturar imagens com atenção e sensibilidade. Com o tempo, passou a registrar também paisagens urbanas dos centros de Vila Velha e Vitória. Atualmente, reside em Porto Alegre, RS, onde cursa mestrado em Zoologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Natural de Vila Velha, Espírito Santo, iniciou sua trajetória na fotografia como um flâneur, registrando com o celular cada impressão e curiosidade sobre luz e sombra. De forma autodidata, aprendeu a fotografar no modo manual durante uma viagem a Goiás para reencontrar seu tio, a quem não via há anos. Essa experiência, aliada às reconexões familiares e à beleza estética do lugar, transformou sua visão de mundo, despertando nele o interesse por capturar imagens com atenção e sensibilidade. Com o tempo, passou a registrar também paisagens urbanas dos centros de Vila Velha e Vitória. Atualmente, reside em Porto Alegre, RS, onde cursa mestrado em Zoologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.